Neon Genesis Evangelion
/Sabem aquele primo de quem falei neste post aqui? O historiador? No dia 09 de junho de 2020, em plena pandemia, 2 dias depois do meu aniversário, ele me manda a seguinte mensagem, me chamando pelo meu apelido de infância “fu”:
Ele: ow fu
Ele: se liga nesse video, agora deu para eu começar a entender com o q vc trabalha
Ele: quem diria que iria descobrir um pouco mais do seu trampo num video de anime
Quando ele fala do meu “trampo”, ele se referia ao trabalho de conceituação.
E quando ele fala sobre o vídeo, trata-se de um dos episódios do canal mimimidias, em que o designer Leonardo de Oliveira analisa o design da série de anime japonês Neon Genesis Evangelion, criado pelo cineasta e animador Hideaki Anno em 1995.
Eu nunca tinha nem sequer ouvido falar dessa série até aquele momento. Meu conhecimento sobre animes japoneses era hiper limitado, composto por apenas 3 filmes: Akira (1988, de Katsuhiro Otomo), Ghost In The Shell (1995, de Mamoru Oshii) e A Viagem de Chihiro (2003, de Hayao Miyazaki).
Naturalmente, pedi para ele me contar um pouco sobre a série Neon Genesis Evangelion. Eis que o seguinte diálogo se desenvolveu:
Ele: Vc devia assistir esse anime
Ele: Se vc tiver tempo
Ele: Gosta de ficar entediado e triste ao mesmo tempo
Ele: Recomendo
Eu: hahaha
Eu: demorou
Ele: Kakaka
(Meu primo tem um humor meio esquisito. Mas por alguma razão, para mim, super funciona. ;o))
Eu: eu curto anime
Eu: mas não acompanho muito, não sei por que
Ele: tem no netflix
Ele: E na moral
Ele: Não vou dar spoilers
Ele: Mas acho q os últimos 2 episódios
Ele: Vão mudar sua vida
Ele: Mano
Ele: Vc q é um cara sensível
Ele: Vai sair tocado dos 2 últimos episódios
Ele: E da última cena
A partir desse ponto, ele começa a se aprofundar e dar um pouco mais de detalhes sobre a série, e palavras como “sentido”, “mensagem”, filosófica” começam a aparecer na conversa.
Ele: Vou falar
Ele: Eu comecei a assistir pq queria ver uns robôs batendo em kaiju
Eu: HAHAHAHAHAHAHAHAHA
Ele: Eu saí procurando consultório de terapia
Ele: O bagulho é outro
Eu: HAHAHAHAHAHAHAHAH
Ele: Fiquei em crise existencial por uns 3 dias
Eu: Hahaha
Ele: Os últimos 2 episódios mano
Ele: Vc vê pela primeira vez e não entende nada
Ele: Mas aí vc pensa no sentido da mensagem
Ele: É muito triste e muito esperançosa ao mesmo tempo
Eu: pô
Eu: demorou!!
Eu: mas não entendi. o que é? É um seriado? É um filme?
Ele: É uma série
Eu: ahhh tah
Eu: fechou
Ele: Onde monstros estão lutando contra humanos
Ele: Só vou falar isso
Ele: Mas o drama
Ele: Tem uma espinha dorsal filosófica muito forte
Ele: O dilema do ouriço
Ele: Só isso q vc tem q saber
Agora, eu é que queria saber mais e ir ainda mais fundo.
Eu: dilema do ouriço? What the hell is that? hahaha
Eu: mano
Ele: Tem vários simbolismos, vários nexos religiosos, mas isso não eh central
Eu: conversar com vc eh food for thought for daaaayyyys homie
Ele: só o dilema do ouriço que eh o cerne
Eu: hahahaha
Eu: demorou
Neste momento, meu primo dá uma pausa, vai no Wikipedia, e manda o seguinte para mim.
Ele: The hedgehog's dilemma, or sometimes the porcupine dilemma, is a metaphor about the challenges of human intimacy. It describes a situation in which a group of hedgehogs seek to move close to one another to share heat during cold weather. They must remain apart, however, as they cannot avoid hurting one another with their sharp spines. Though they all share the intention of a close reciprocal relationship, this may not occur, for reasons they cannot avoid.
Ele: basicamente, é que nos torna humanos. É o que nos causa dor e sofrimento
Ele: mano, vou parar de falar
Ele: vai estragar a série para vc
Eu: ahhhhh tô ligado! não conhecia por esse nome. saquei!! demorou!!! vou ver muito essa série!
Ele: neon genesis evangelion de 1995
Ele: não baixa o errado, não
Ele: tem filmes e reboots
Eu: tah
Eu: neon genesis evangelion
Eu: bom
Ele: não fica triste tá
Ele: tudo se resolve no final
Eu: isso que eu ia falar mano
Eu: do jeito que eu sou
Eu: se eu me matar depois
Eu: já sabe de quem foi a culpa
Ele: eh então
Eu: vou deixar uma carta pra vc
Eu: hahaha
Ele: se vc terminar
Ele: vc vai sair com muito mais vontade de viver
Ele: kkkakkaa
Ele: mas tem q chegar no final
Eu: e na carta vai estar escrito apenas: WWWWWHHHHHYYYYYY???????
Ele: kkaskkksakaksks
Eu: HAHAHA
Isso é o que ele tinha para me falar sobre a série Neon Genesis Evangelion. Extremamente instigante. Como eu mencionei na conversa, essa série tem cara de ser praticamente um rodízio all-you-can-eat de food for thought.
Mas pra falar a verdade, considerando que eu – de fato – sou um cara sensível demais, com a pandemia e esse monte de notícias tristes e pesadas às quais somos expostos todos os dias, confesso que não tive muita coragem de mergulhar na série. Acho que minha cabeça não ia agüentar a porrada.
Motivo pelo qual, ao invés disso, preferi assistir àquelas comédias românticas que sempre costumam passar na época de Natal, sabem? Aquele tipo de filme em que tudo acaba bem, mega água com açúcar e que você já sabe como vai terminar a partir do primeiro segundo da primeira cena. Mas definitivamente, Neon Genesis Evangelion está na lista.
Bom, eu posso ainda não ter assistido à série, mas definitivamente assisti ao vídeo que meu primo enviou (abaixo). E compreendi por que ele disse que finalmente começou a entender melhor com o que eu trabalho. Compreendi o motivo pelo qual ele disse que descobriu um pouco mais sobre o “meu trampo” de conceituação.
Em um determinado intervalo do vídeo, de 2’08” até 3’10”, o designer Leonardo de Oliveira, ao analisar o visual da série, diz o seguinte:
“Hoje a gente vai falar do design de Evangelion. Tipo, é muito fácil falar que o visual de uma obra é resultado estritamente de um lapso criativo – de um dom –, de um dado artista, né? Mas não é bem assim. Quando a gente fala do design de algo, e no caso aqui, do Evangelion, é muito fácil as pessoas pensarem especificamente, somente, nos aspectos estéticos e visuais. Só que vai um pouquinho mais fundo. O design não para por aí.
Design é projeto. É concepção. É CONCEITO.
E é tudo aquilo que tem na ideia e que depois, culmina no aspecto visual. O visual é um reflexo de tudo aquilo que aconteceu anteriormente dentro do processo criativo. Desde um enredo até uma ideia ou um sentimento, ele (o visual) é a materialização disso tudo. O mais interessante é quando o visual nos ajuda a contar aquela história em questão e a dar a sensação que o criador tinha como intenção.”
Tiro o chapéu para o Leonardo de Oliveira: esta é uma maneira muito didática de explicar o trabalho de conceituação.
Fico imaginando o que se passou na cabeça do meu primo quando ele assistiu a esse vídeo. Meu palpite é que ao ver este trecho do vídeo que acabei de transcrever, ele entendeu – racionalmente –, o que ele já havia entendido meio que empiricamente. Mesmo antes de assistir a esse episódio do mimimidias, meu primo já havia entendido que algo na série Neon Genesis Evangelion tinha deixado um impacto grande nele. Tão grande que ele praticamente “ficou em crise existencial uns 3 dias”. ;o)
Esse algo tem um nome. No diálogo que reproduzi, meu primo chamou esse algo de “sentido da mensagem”, “simbolismos e nexos”, e de “espinha dorsal filosófica”.
Mas como eu já havia dito neste post, eu não sou tão inteligente quanto meu primo.
Por isso, eu uso um nome bem mais simples. Eu chamo esse algo de...
Bom, vocês já sabem, né? ;o))